Fonte: Diário do Minho. Autor: Luís M. Figueiredo Rodrigues
A hospitalidade é mais do que boa educação: é um modo de organizar a vida comum para que cada pessoa possa existir. Numa comunidade terapêutica ao serviço da saúde mental, esse modo torna-se princípio estruturante do cuidado. Aqui, acolher não é integrar o outro nos nossos “esquemas mentais”; é criar espaço para que reapareça a sua própria voz, mesmo quando frágil, e se reconstruam vínculos capazes de sustentar a esperança.
O fundamento é antropológico: somos seres de abertura e de dependência mútua. A falta de saúde psíquica não suprime esta condição; torna-a visível e, por vezes, dolorosa. A comunidade hospitaleira nasce precisamente para proporcionar estima e confiança, permitindo que o sujeito recupere pertença e sentido. A hospitalidade, assim, não é floreado ético; é ambiente ontológico onde a pessoa volta a ser reconhecida antes de qualquer diagnóstico.
Como princípio terapêutico, a hospitalidade traduz-se em práticas concretas: escuta sem julgamento; respeito pelos ritmos; regras claras e estáveis sem rigidez punitiva; linguagem que nomeia sem reduzir à mera patologia; participação gradual nas decisões. O centro é a presença, não a produtividade. Sabemos que quem sofre não pede técnicas sofisticadas, mas lugares onde possa ser amado; Henri Nouwen (1932-1996) descreveu o cuidador como “o curador ferido”: só quem reconhece a própria vulnerabilidade acompanha sem dominar. Por isso, a hospitalidade cura ao restituir confiança e ao reabrir horizontes de relação.
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