Fonte: Diário do Minho. Autor: Luís M. Figueiredo Rodrigues
Viver o Reino de Deus, mais do que o construir, é uma das conversões mais urgentes para a Igreja de hoje. Durante décadas habituámo-nos a falar de “construção do Reino”, como se a fé fosse sobretudo um estaleiro religioso, com planos, metas e indicadores. Sem negar a importância de organizar e avaliar, creio que essa linguagem já não chega. O Evangelho sugere outra gramática: o Reino não é um projeto que erguemos com as nossas forças, é uma vida recebida e aprendida no tecido concreto da vida comum, com feridas e possibilidades.
As ciências da complexidade ajudam-nos a perceber o alcance desta mudança. Falam-nos de “emergência” quando, a partir de interações locais simples, surgem formas novas de organização que não se explicam só pela soma das partes. Não há um comando central; há uma aprendizagem contínua, feita de ajustes e conflitos, até que se estabilizam novos equilíbrios. Se olharmos para a Igreja com esta lente, percebemos que a sua vitalidade não começa nos organogramas nem nos documentos, mas em pequenos gestos repetidos com fidelidade: grupos que se reúnem para ler a Palavra de Deus, vizinhos que cuidam de quem está só, comunidades que celebram a Eucaristia e dela saem mais disponíveis para servir.